Esse lugar é tão lindo que eu tenho vontade de cagar nele. Tenho vontade de mergulhar no lago e mijar dentro, marcar território num lugar que não é meu e nem vai ser.
A situação me deixou tão tensa ao ponto de me cegar perante a beleza da natureza. Os pássaros e pombas comuns me inspiram inveja ao invés de admiração. Eles cantam e vivem aqui tão alheios à minha tensão que me dá ódio da irracionalidade dos animais. Como no dia em que eu, dramática, chorava em busca da compreensão do meu gato que dormia e às vezes me olhava com os olhos pela metade a me perguntar se eu não o deixaria dormir em paz. Eu não escolhi não ser como eles, qual o remédio pra mim?
Começo a entender porque alguns humanos sentem prazer ao aprisioná-los. É a vida racional tornando-os perfeitos sádicos. É claro que trocaríamos toda nossa responsabilidade de dominar a razão por dias de cantos e bater de asas! Não se tem liberdade quando seus pés estão no chão. Não se tem liberdade quando milhões de semelhantes estão prontos para te julgar incapaz. Entre as aves não há preconceitos. Todos sabem voar. Mas pra mim... voar depende dos outros. E os outros nunca querem erguer o pescoço gordo para te encontrar.
Hoje eu posso ter desculpas por bancar a distorcedora de valores. Eu quis me esquecer de tudo - sem querer. Foi uma tentativa - falida - de me assemelhar às aves. Aquelas idiotas. Não existe dia certo para sonhar, exceto esse.
Esse lugar é tão lindo que eu gostaria de ser enterrada nele; sob o coral de pássaros e pombas comuns que cagariam pra minha morte e reproduziriam-se no lugar dos meus filhos e netos.
Pode ser que hoje algum deles morra por minha culpa... e isso eu nunca vou saber.