terça-feira, 4 de maio de 2010

Sobre enganos propositais e arrependimentos tardios.

De repente, na manhã mais solitária do mês - depois de um sonho ou uma noite mal dormida - ele acordou preparado para aceitar sua própria verdade crua.

Talvez tenha sentido a noite inteira vazia, ou o mês inteiro infeliz. Talvez tenha sentido saudade de alguém que nunca quis. Talvez um dia numa sala de aula lotada ele tenha procurado - por instinto - apenas um olhar, só um olhar mais intenso que estivesse teimosamente vivo por sua culpa, em vão. Talvez os shows estivessem mais calmos e menos iluminados, ou a plateia fosse só ventiladores... mas ele começou a sentir frio e mesmo a garrafa vazia, nem esta conseguia dar-lhe o calor necessário - que era bem dentro do peito. Talvez, até mesmo seu pai - aquele monstro que roubou-lhe a liberdade de criança - tenha mostrado-lhe através de vômitos e oratórias o engano, o grande engano da covardia de não assumir nem encarar seu grande Amor. Ele, que sempre negou seu sobrenome, acordou na manhã mais solitária do ano e ao invés de escovar os dentes grandes e brancos, olhou-se no espelho e viu os mesmos olhos tristes de quem fugiu da felicidade, velhos de quem não vive e cansados de quem finge rir suas lágrimas; os mesmos olhos de seu quem-dera-amado pai.

Talvez por tudo isso, por cada uma de todas as minhas hipóteses, ele tenha sentido a necessidade de ouvir a única voz que o reconhecia como homem e que, no entanto, ele evitou por tanto tempo. Por isso - e não por outro engano proposital - ele me acordou num pulo e com o coração finalmente batendo com vontade, assumiu para si mesmo algo que eu já sabia há tempos: "Desculpa, foi engano". "O maior dessa vida", eu responderia em lentos batimentos cardíacos, que provavelmente nunca servirão de consolo.

Imagem: ¿Quién es Quién? - El NAF