Fui para aprender, para crescer e sugar, sugar, sugar... E me sugaram inteira.
Observei os traços, os passos e os pedaços. Cada vício de expressão eu decorei. Limpei cada ladrilho, montei cada bancada, lavei todos os bicos e deixei o pó pra lá... Tornei-me o pó que vigiava, curioso, enquanto queriam me limpar. Sei das agulhas, das músicas e dos horários sem terror. Do pescoço que inclina levemente, dos anseios de amor, dos traumas de infância, das famílias imperfeitas, da barriga que cresce com vida e dor. Sei de como dividiam vidas comigo, enquanto recusavam-se a aceitar esse fato. E sei dos olhares que nada dizem – ah! quem me dera não saber desses - enquanto tudo que eu buscava tornava-se palavras mudas. Não olhava para mim, que limpava seu chão e decorava sua agenda com cifrões. “Money over bitches” e eu no vermelho. Família no telefone, amigos na internet e eu sozinha no paraíso, limpando o ralo que só servia para entupir e sugando o pó que deixavam para trás, para mim. Porque o resto também vale a dor de não ser nada antes de ir para o lixo.
Adiei minha partida o quanto pude, na esperança de ver um sorriso e ouvir um sim. Prendia o choro na garganta e atendia o telefone sorrindo. É verdade: entre bonés, tênis e computadores de marca, eu era a mais ignorante. E talvez por isso eu não servisse para seguir os passos que me mostravam, por não querer regredir meus valores humanóides. Há mais vida lá fora do que armas e glória, eu vi. E esse dom que só os homens têm, e essa letra que só os homens têm, e essa armadura que só os homens têm, e esse caminho que só os homens conhecem... não fizeram parte de mim.
E eu agradeço por isso: pela única oportunidade que eu perdi, de me perder.